Um burro assim até podia ser Presidente

Pose para postal ilustrado

Neste dia 1 de Abril, para alguns, incluindo (o que é estranho) órgãos de comunicação social, dia de petas ou mentiras, veio-me à memória a mentira em que se transformavam, antes do 25 de Abril, os ensaios de teatro para os senhoras da Censura, um exercício onde era preciso disfarçar as passagens do espectáculo mais potencialmente sensíveis aos critérios dos censores. Lembro o ensaio da peça "O Asno", de José Ruibal, que o Teatro dos Estudantes da Universidade de Coimbra (TEUC) representou em 1973, numa encenação de Fernando Gusmão. A dada altura, quando os americanos tentavam vender um burro electrónico, todo sofisticado, o potencial e falsamente ingénuo comprador dizia que - cito - "um burro assim até podia ser Presidentre da República". A frase, dita de forma quase imperceptível no ensaio da Censura, passou no crivo dos censores e tornou-se o ponto alto dos espectáculos com o público a aplaudi-la demoradamente no momento em que era proferida. Era uma fórmula possível, posto que perigosa, de afrontar o então Presidente da República, Américo Tomaz, militar que tinha sido eleito para o cargo em eleições fraudulentas e não democráticas. Mentiras que não eram só do dia 1 de Abril.