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Na pandemia da COVID-19

Ponte 2, Júlio Roldão, 2019, técnica mista (25,5X10X2,5 cm)

Carta para o M.A. Pina

Agora nem isso,
meu querido Pina.
Nem as funerárias
conseguem intrometer-se
(Atlética Funerária incluída)
nesse espaço que separa
a vida da morte.
Devias estar por cá
para registar
poeticamente
este outro tempo de chumbo.
Muito mais pesado.

Releio o teu Farewell Happy Fields! (...)
"(Sem ironia, o meu coração teme a ironia
quase tanto quanto a perfeição;

e sem melancolia:
estávamos a precisar de solidão,
de silêncio, de geometria,
e as nossas lágrimas de uma grande razão)."
(...)

Só tenho rascunhos
e alguns discursos
- vendidos ao desbarato -
de muitas encarnações
que jamais vivi.

Mais a leitura poética
de alguns versos escolhidos.
E também esse jornal
com todas as más notícias
(a mostrar o fantasma de Milão
na primeira página
e as cinzas dos mortos)
e outras desesperanças.

Como começar de novo?

Júlio Roldão
06.04.2020