Na pandemia da COVID-19
06.abr.2020, Em pleno confinamento
Carta para o M.A. Pina
Agora nem isso,
meu querido Pina.
Nem as funerárias
conseguem intrometer-se
(Atlética Funerária incluída)
nesse espaço que separa
a vida da morte.
Devias estar por cá
para registar
poeticamente
este outro tempo de chumbo.
Muito mais pesado.
Releio o teu Farewell Happy Fields! (...)
"(Sem ironia, o meu coração teme a ironia
quase tanto quanto a perfeição;
e sem melancolia:
estávamos a precisar de solidão,
de silêncio, de geometria,
e as nossas lágrimas de uma grande razão)."
(...)
Só tenho rascunhos
e alguns discursos
- vendidos ao desbarato -
de muitas encarnações
que jamais vivi.
Mais a leitura poética
de alguns versos escolhidos.
E também esse jornal
com todas as más notícias
(a mostrar o fantasma de Milão
na primeira página
e as cinzas dos mortos)
e outras desesperanças.
Como começar de novo?
Júlio Roldão
06.04.2020